PREVIDÊNCIA RURAL

A Previdência Social existe no Brasil há 92 anos, em razão da Lei Eloy Chaves. Nesse período, quase metade da população habitava no meio rural. Porém, os primeiros benefícios a trabalhadores rurais só foram concedidos a partir da Lei Complementar nº 11, de 25 de maio de 1971. Entretanto, no sistema previdenciário em sentido estrito, essa categoria foi incluída tardiamente com a Lei 8.213/91, com a criação da figura do segurado especial, quando a população residente no meio rural já havia reduzido para 22%.

A exposição de motivos da Lei 8.213/91 conferiu a condição de segurado- trabalhador aos agricultores familiares e pescadores artesanais,reconhecendo a contribuição para o país. Porém, ainda persistem e resistem preconceitos contra essa respeitada classe laboral, de tal forma que a inserção no Plano de Benefícios é tida como uma benesse do sistema, e não um direito socialmente conquistado pelo trabalho árduo no campo, que alimenta a cidade. Indubitavelmente, a inclusão dos trabalhadores rurais, embora tardia, busca recuperar uma dívida histórica, posto que a Previdência foi se aproximando da população rural na medida em que esta migrava para o meio urbano.

As estatísticas confirmam que a evolução do êxodo rural teve, dentre outras causas, a de inexistir proteção previdenciária. Com a edição da recente Lei 11.718/08, aproximou-se o conceito de segurado especial, pela lei previdenciária, do conceito de agricultor familiar, da Lei 11.326/06, que institucionalizou políticas públicas para o setor.

É possível concluir que, ao contrário do que muitos ainda pensam e defendem, os trabalhadores rurais contribuem para a Previdência Social e o fazem desde 1971. Portanto, não se trata de benefício sem contribuição; trata-se apenas de sistema contributivo diferenciado, moldado à realidade dos segurados especiais, ou seja, a contribuição incide sobre o que produzem e quando produzem.

A Constituição Federal estabeleceu a fonte de custeio dos benefícios rurais nas contribuições sociais, tendo em vistas as limitações contributivas. De outra forma, estes trabalhadores não teriam condições de se manter nas lides campesinas, em razão da baixa rentabilidade do ofício, que é fonte para produção dos alimentos integrantes da cesta básica, alcançando mais de 70% deste fornecimento.

As contribuições previdenciárias do empregador rural pessoa física e segurado especial incidem sobre a comercialização da produção, com alíquotas variáveis entre 2% e 0,1%, conforme prevê o art. 25 da Lei 8.212/91. Porém, diante da dificuldade na fiscalização, como também, das discussões judiciais sobre a legislação de custeio, ainda se mantém a insegurança e a baixa arrecadação desta fonte de recursos para a Seguridade Social. Ainda é preciso avançar, na prática, para que se promova a completa integração dos agricultores familiares e pescadores artesanais como sujeitos de direitos em atendimento aos preceitos constitucionais e legais, comparado às grandes contribuições que o lavor deles produz na economia e na sociedade como um todo.

A principal causa das propostas de reforma é a informação de que as contribuições rurais não cobrem o financiamento dos benefícios. A Constituição Cidadã igualizou os segurados urbanos e rurais, para fins da Seguridade Social e,diante da nova matriz contributiva, impôs ao sistema a função social protegida, distribuindo as receitas.

Os programas destinados à proteção do trabalhador rural merecem tempo para que possa ter financiamento direto e equilíbrio. Invariavelmente, sempre que se comenta o déficit da Previdência Social, ressurge o debate em torno do “prejuízo” causado pelos trabalhadores rurais. A par do equívoco do próprio déficit, muito questionado, observa-se que é precária a fiscalização da contribuição previdenciária (que deve ser recolhida, em regra, pela empresa adquirente da produção), como também, as delongas judiciais sobre as normas contributivas, resultam em efetiva arrecadação próxima a um quinto do valor que deveria ingressar nos cofres da Previdência. O Valor Bruto da Produção Agropecuária de 2015, segundo dados divulgados pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil- CNA, girou em torno de R$ 516 bilhões.

Em contrapartida, diante das renúncias, imunidades, desonerações e baixa fiscalização, em 2014 as contribuições previdenciárias à Seguridade Social somaram apenas R$ 7 bilhões, enquanto os pagamentos de benefícios rurais demandamo valor de R$ 98 bilhões por ano, em média. Logo, é inevitável adentrar na realidade dos trabalhadores rurais para que se possa compreender o escopo dessa proteção específica e diferenciada, com vistas à promoção de um debate justo acerca do tema e das propostas de reforma que possam o envolver.